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Depois de cumprir uma maratona de 22 dias, que trouxe a Porto Alegre 53 espetáculos representativos de 16 estados brasileiros, e de discutir temas como Negritude em Cena, cruzamentos de expressões artísticas, Gêneros, e limites entre o real e a ficção durante o Seminário Práticas Políticas na Cena Contemporânea, ainda faltava ao Palco Giratório refletir sobre os festivais em si.
Isso aconteceu na noite de 23 de maio, durante o evento Ação de Curadoria, uma parceria entre o SESC/POA e a secretaria municipal de Cultura de Porto Alegre. A iniciativa do encontro foi da gaúcha Michele Rolim, como contrapartida devida ao Concurso Fumproarte - Edital Décio Freitas, com o qual a jornalista e crítica teatral foi contemplada em 2014.
Frente a um público de quase 50 pessoas, no Teatro Sesc Centro, Michele mediou um debate de duas horas que reuniu uma amostragem eclética de curadores de festivais de artes cênicas. Representando o Palco Giratório, compareceram Jane Schoninger (Sesc/POA) e Vicente Pereira Júnior (Sesc/RJ). O Porto Alegre Em Cena estava presente com Luciano Alabarse, coordenador de 19 das 23 edições do evento. Participou também Alexandre Vargas, idealizador e coordenador do Festival Internacional de Teatro de Rua de Porto Alegre (Fitrupa).
O debate começou evidenciando a diversidade de procedimentos na escolha das atrações de um festival de artes cênicas. Jane explicou que a escalação das várias edições do Palco Giratório pelo país é decidida por um coletivo de 33 curadores, representantes de todos os estados brasileiros e de algumas unidades autônomas do Sesc. “Usamos como base as cenas locais e o que vemos em outras cidades. Somos curadores, ou seja, selecionamos espetáculos, mas também pensamos em ações e discussões que podem integrar a programação do Palco Giratório”. Pereira Júnior complementou dizendo que “é como se todo o Brasil estivesse representado em uma sala. Quando sobe a fumaça branca, ou seja, quando chegamos a uma conclusão, ficam com rachaduras, mas isso faz parte”.
Luciano Alabarse destacou a diferença de estratégias de cada evento, e explicou que a curadoria do Em Cena é feita basicamente por ele e por sua equipe, sem representantes, ao menos formais, em outros locais. Os procedimentos variam: a seleção dos espetáculos nacionais, por exemplo, se faz por inscrição, valendo-se de DVDs que são enviados ao Em Cena (mais de 530 unidades na edição 2016 do festival). Os candidatos gaúchos são avaliados por uma comissão. O método de convites é usado também no caso de atrações nacionais e internacionais.
Vargas afirmou que é complicado se restringir ao sistema de inscrições quando se pretende uma curadoria mais ambiciosa. A solução passa pelos convites, que devem levar em conta elementos como as parcerias do festival, o momento político, as limitações de orçamento, na maior parte dos festivais financiado fundamentalmente via leis de incentivo.
A crise econômica que ameaçou a realização de alguns festivais de artes cênicas no Brasil foi reconhecida e lamentada. Pra enfrentá-la, os curadores apontaram estratégias e identificaram públicos-alvo diversos.
Alabarse descreveu o Em Cena como evento além das artes cênicas: “Somos um festival de palco, o que pode incluir música e outras manifestações de palco. Queremos contemplar todos os tipos de público”. O curador e também diretor teatral contou que, quando vai ao teatro na capital gaúcha, vê quase sempre as mesmas pessoas na plateia. “Mas eu quero todas as pessoas da cidade, por isso o festival se chama Porto Alegre Em Cena”.
A coordenadora do Palco Giratório/POA falou da preocupação em interagir também com a cena artística de cada localidade: “Lembro que, até uns três anos, não havia a disposição dos artistas locais de conhecer trabalhos de outros lugares. Agora, há. Como instituição, queremos que o maior número de pessoas participe e consuma cultura”.
A questão sobre quais critérios seriam usados na curadoria, dividiu os participantes. Vargas confessou: ”Meu prazer é quando consigo problematizar a edição, o que não acontece sempre. Mas o festival é para provocar, para se autoquestionar também”. Alabarse concordou que um bom festival deve ter a capacidade de também provocar polêmica, e alertou que não se deve esquecer a necessidade de despertar interesse do público e da mídia. Pereira Júnior observou que o Palco Giratório está atento a trabalhos que sejam instigantes para a juventude e a criações ligadas à arte circense e ao patrimônio imaterial. Jane explicou que a atenção dos curadores do Sesc não se restringe apenas a montagens que se destacam pelo resultado estético – o processo também é avaliado e valorizado.
Vargas registrou ainda que o próprio festival pode dar pistas ou fornecer estímulos para que se imagine uma futura programação. Ele recorda que em uma das edições do Fitrupa a produção local incluía muitas farsas: “No ano seguinte, problematizamos isso e questionamos se a produção local de teatro de rua em Porto Alegre estava sintonizada com a produção contemporânea”.
Quando Michele questionou sobre se o curador em artes cênicas, a exemplo de seus similares no âmbito das artes visuais, exercitam uma autoria artística e são por isso reconhecidos, não houve unanimidade. Alabarse limitou autoria artística às situações em que ele está dirigindo suas montagens. Vargas apontou as particularidades das artes cênicas feitas na rua para argumentar que, quando propõe um local ou um público diverso daquele que o grupo está acostumado a lidar, inevitavelmente o curador se investe de parcela de criação no resultado final. Jane concordou com Vargas, mas afirmou que “o curador me parece mais um agente político em função das apostas [estéticas] que faz”.
Ao final da Ação de Curadoria, a conjuntura política e institucional também entrou em cena, quando Alexandre Vargas leu um manifesto emitido pela Rede de Festivais de Teatro, posicionando-se pela manutenção do Ministério da Cultura. Alabarse rebateu com energia manifestações preconceituosas contra artistas que fazem a defesa do MinC e de instrumentos como a Lei Rouanet.
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