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Nunca é fácil criar um espetáculo para crianças. É preciso conquistar suas atenções constantemente. E muitos são os instantes em que estes espectadores podem se desviar para outros interesses, acontecimentos ou elementos que nada imaginaríamos significar. Quem nunca flagrou uma criança se divertindo apaixonadamente com a caixa do presente enquanto o objeto em si reside sua solidão ao lado? Provocar essa conquista no teatro é ainda mais complexo. Tudo ali, luzes, espaço, ineditismo, descobertas, cores, sons, outras crianças... Os desvios parecem infinitos. E são. Porque cada criança é uma, e não existe um mapeamento capaz de traduzi-las aos artistas. Entramos no teatro, e junto, para minha sorte, uma dezena de crianças ainda novas formavam a fila com expectativa no olhar. Em pleno domingo, Dia das Mães, foram levadas ao teatro no meio da tarde. Estarem ali significava mais do que apenas um passatempo, portanto. O teatro era o lugar de aquelas crianças comemorarem e curtirem suas mães. E isso era realmente entusiasmante.
ETC... começa com os números característicos circenses. As crianças assistem atentas. Com exceção do pequeno garoto livre e aventureiro circulando pelo palco com naturalidade. Ele se divertia. A mãe não se preocupava. Os atores e eu, sim. Havia perigo, riscos reais de encontros não calculados, esbarrões desproporcionais, quedas de objetos. Mas a mãe, a quem nada disso parecia ser um problema, estava mesmo a fim de ficar ali, sozinha, até mesmo sem ele. Para ela, o teatro parecia servir de esconderijo, talvez até de sua condição materna.
O espetáculo, orientado por Juliano Rossi e Tadeu Liesenfield, alcança com precisão os interesses infantis principalmente nos momentos em que as crianças se divertem com peripécias e atrapalhadas. Não haveria de ser diferente. No entanto, é preciso sempre estarmos atentos ao fato de que uma criança não vai sozinha ao teatro, lá também estão os adultos, e sem que o espetáculo também se proponha a eles o tempo demora a passar. Uma criança pode entusiasmar os pais e vice-versa. Sem que os números apresentem radicalmente acabamentos e inventividades, caso se mantenham limitados ao primeiro imaginário das ações e dificuldades, dificilmente oferecem os argumentos às atenções dos adultos presentes.
Também as crianças não pareciam se entusiasmar com as cenas. A reviravolta ocorre, colocando novamente o espetáculo sob controle dos artistas, ao incluírem as crianças no palco-picadeiro, seja pra recolher bolas coloridas que explodiram magicamente por de trás do cenário, seja para participar de instantes em que tudo poderia acontecer. As diversas intervenções envolvendo a plateia, no entanto, quase sempre se deram com os adultos. Melhor seriam com as crianças, não? Afinal, elas esperavam ou temiam ansiosas por essa quebra da quarta parede. Que criança não tem prazer e medo do palhaço em iguais proporções até compreender sua natureza? Sendo, então, o grande atributo do espetáculo a inclusão, o melhor será mesmo investigar mais profundamente essa relação com os pequenos para nela encontrar os números e não o contrário, pois certamente nada é mais divertido ao adulto que ver seu filho e filha em pleno estado de descoberta e encantamento.
Com boas escolhas dos papéis de cada ator, em seus desenhos simples e funcionais, as empatias transitaram entre as crianças de um ao outro todo o tempo. O que não é fácil conseguir. Pode-se ler essa facilidade como um acerto do grupo e da direção, cuja potência pode ser ainda mais explorada na manipulação dos interesses do pequeno público. As crianças são cruéis, sabemos, e cruéis sobretudo na ausência de filtros sobre suas reações. Em ETC..., a disposição foi se dando passo a passo, momento a momento, terminando em sorrisos abertos, sinceros, risadas altas e palmas fortes. As crianças superaram o ritmo do espetáculo e encontraram suas próprias maneiras de por ele sonhar e imaginar, e então se renderam ao prazer de ali estarem.
Ao final, a corrida para tirarem fotos juntos aos artistas disse muito sobre as conquistas e respostas. E, por sorte, inacreditavelmente o garotinho desbravador se salvou de qualquer incidente, obrigando a mãe a ter que novamente reencontrar o filho e conviver com um moleque que, ali, um tanto abandonado, já se revela autossuficiente e mais maduro que muitos que lá estavam.
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ETC...
Com: Tainá Borges, Luís Cocolichio, Lara Rocho e Annita Brusque
Orientação Cênica: Juliano Rossi e Tadeu Liesenfeld
Operação de som: Osvaldo Vergara
Iluminação: Mirco Zanini
Cenário: Juliano Rossi
Figurinos: Mônica Kern
Fotografia: Sal Fotografia