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O dramaturgo alemão de 32 anos fala sobre a estreia no Brasil de paradies spielen (jogar paraíso), que será encenado independentemente pelos diretores gaúchos João de Ricardo (Cia Espaço em Branco) e Mauricio Casiraghi (ATO Cia Cênica) e, dentro do projeto Transit 2019. As montagens estrearão em maio durante o festival Palco Giratório SESC, em Porto Alegre.
A montagem de João de Ricardo, Tocar Paraíso, estreará em 16 e 17 maio. A direção de Mauricio Casiraghi resultou em Expresso Paraíso e estará em cartaz 21 e 22 de maio. As duas temporadas serão no Teatro do Goethe-Institut Porto Alegre.
Os editores do AGORA, Michele Rolim e Renato Mendonça, estão acompanhando os processos de criação dos dois espetáculos na condição de críticos internos e postarão seus relatos e reflexões no site.
Thomas Köck estará na capital gaúcha para acompanhar as estreias e participará de debate sobre o texto e as encenações, dia 21 de maio, para ele o seu trabalho consiste em questionar as autocontradições do sistema: “Começo a me perguntar de onde é que vem essas supostas certezas, quem as estabeleceu, no que elas se baseiam e por que nós as aceitamos de forma tão 'indiscutível'. E muito rapidamente a gente vai parar no meio de uma discussão sobre quem de fato está autorizado a falar sobre o quê, quem aparece na história e quem não”.
Em 2018 Thomas Köck recebeu o prêmio de dramaturgo de Mülheim por paradies spielen e no festival deste ano em Mülheim, sua mais nova peça atlas foi uma das 10 peças selecionadas. Os vencedores do Prêmio de Dramaturgos Mülheim de 2019 serão anunciados em 1 de junho de 2019.
O AGORA enviou algumas perguntas via email para Köck. Confira abaixo as respostas:
AGORA – O senhor começou a trabalhar como músico ainda adolescente, depois estudou literatura e filosofia até começar a escrever para o teatro e para cinema. De que maneira essa formação tão variada aparece em suas peças?
Thomas Köck – Provavelmente sobretudo no seu modo de construção e sobretudo pelo fato de que, para mim, a língua é, em primeiro lugar, ritmo, som e sonoridade, e somente em segundo lugar, conteúdo. Pelo fato de que a língua tem um destinatário e de que as frases precisam e devem ser usadas por alguém. E de que a pessoa que usa essas frases pode entrar no ritmo desses textos, tornar-se cúmplice da língua. O que porém não significa que seja tudo somente uma abstração, um simples formalismo. É quando, então, às vezes, surgem a filosofia ou uma influência teórica. Porque um texto precisa “girar em torno de alguma coisa”, tem que “convencionar algo”. Mas isso não como o foco principal e não de forma que a língua somente se coloque a serviço dessa convenção ou seja um simples veículo dessa. Ela pode tornar-se autônoma - essa linguagem, com a qual sempre tudo começa e tudo termina.
AGORA – Nas rubricas de Flooding Paradise e de Paradies Spielen o senhor usa termos que normalmente definem o andamento de uma música. Suas peças podem ser entendidas como pequenas sinfonias?
T. K. – Eu não teria nenhuma objeção. No aspecto da construção e também ao ter um tema sempre recorrente, eu trabalho um pouco de acordo com princípios da música. Acharia ótimo se os textos também suscitassem sinfonias. Mas que fosse então uma música contemporânea. Ambient e drone music, com sintetizadores modulares. Alessandro Cortini e Lucrecia Dalt poderiam muito bem compor algo assim. E talvez uma ou duas orquestras como acompanhamento.
AGORA – Seu engajamento político é evidente. Um dos documentários que dirigiu tinha como tema a guerra do Líbano, e o senhor também participa ativamente de um blog que combate a ascensão da direita. De que maneira o engajamento político do artista deve estar na sua obra? Como evitar o tom panfletário na arte?
T. K. – Quanto a isso, eu só posso especular. A princípio, acho que é bem simples: ninguém gosta de ser doutrinado. E muito menos através da arte. As pessoas querem ser conquistadas por ideias, por cores, por uma linguagem, uma sonoridade. Acho também que ninguém escolhe trabalhar de maneira “política”, penso que isso talvez tenha mais a ver com experiências biográficas, tradições de pensamento, esse tipo de coisa. Para mim, muitas vezes a arte começa ali onde as autocontradições do nosso sistema se revelam abertamente. E então eu começo a me perguntar de onde é que vem essas supostas certezas, quem as estabeleceu, no que elas se baseiam e por que nós as aceitamos de forma tão “indiscutível”. E muito rapidamente a gente vai parar no meio de uma discussão sobre quem de fato está autorizado a falar sobre o quê, quem aparece na história e quem não – e a questão sobre quem está autorizado a falar sobre o que é imanentemente política, não importa como se queira interpretá-la. E eu acredito, ou chego aos tropeços à convicção de que, se o aspecto político no trabalho não é decorativo ou um discurso bidimensional, mas aparece como um paradoxo ou uma questão de princípios, isso talvez seja um sinal de que estamos no caminho certo.
AGORA – Em Paradies Spielen, os personagens que estão no trem podem ser entendidos como a Europa atônita com os conflitos e imigrantes que entram em suas fronteiras. Ao mesmo tempo, os refugiados da crise na Venezuela e os milhares de imigrantes ilegais nas ruas das grandes capitais brasileiras sugerem que os problemas expostos na peça se repetem por todo o mundo. O senhor concorda?
T. K. – Infelizmente, provavelmente sim. A Europa, que há setenta anos arrasou seu próprio território através de bombardeios, hoje ergue muros por causa de pessoas que fogem de condições provocadas pela própria Europa ou, pelo menos, pelo modelo econômico ocidental.
AGORA – Uma das cenas da peça é sobre um incêndio, semelhante a uma tragédia que aconteceu na cidade italiana de Prato, em 2013. Em que medida o texto Paradies Spielen é autobiográfico e dialoga com situações reais que ocorreram?
T. K. – Digamos assim: de uma forma ou de outra tudo no texto aconteceu. E o texto é uma grande negação exatamente dessa realidade da qual ele se origina. Só que no sentido de uma resistência contra essa realidade específica. Uma resposta na mesma moeda. A consciência de que, com uma ou duas pequenas mudanças, uma outra realidade teria sido possível.
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