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Como enfrentar cênica e coreograficamente o tal furacão Elis? Aquele cuja voz se transmutou em estrela cujo brilho é indelével até hoje no ambiente da música brasileira?! Das Tripas Sentimento (2018), em cartaz dias 21, 22, 23, 28, 29 e 30 deste mês, às 20h, na Casa Cultural Tony Petzhold, investe nisso. Trata-se de uma recriação com nova seleção de repertório e direção de June Machado, que esteve à frente da empreitada há 18 anos. . Dança, teatro e recursos circenses, mais a trilha pontuada por canções interpretadas por Elis Regina, se imbricam no espaço cênico num misto de manifesto artístico e estético sobre os tempos contemporâneos.
Há, do começo ao fim do trabalho, uma clara vontade de discursar sobre questões do cerceamento das liberdades vividas pela sociedade contemporânea. Vendas nos olhos clamam por serem retiradas e a arte o faz em seu moto-contínuo. É preciso ver, é preciso enfrentar, é preciso dançar sobre isso. A voz ganha corpo, os corpos falam e cantam o tanto de contundência que, repita-se, Elis deixou como legado impecável à MPB. Eis um dos trunfos da remontagem: reorganizar, atualizar e reverberar o que já foi tão significativo.
Na mistura das linguagens artísticas, há vigor no aproveitamento dos diferentes recursos do espaço. As cenas e as danças se esparramam pelo palco, por baixo dele, pela sala, pelas paredes, alcançando empatia. Há focos pontuais em algumas das performances, quando se evidencia a potência de alguns dos intérpretes – como é bom ver o vigoroso corpo-presença de Lu Paludo; é significativo ver Diego Mac em cena, na trama da dança-DNA que a mãe, June, põe em cena outra vez, e ao mesmo tempo afirmando sua linguagem, “macarenando” Gracias a La Vida com humor; é contundente ter Cassandra Calabouço fazendo uma travessia carregada de metáforas.
Por constituir-se de diferentes corpos, com diferentes danças ou performances cênicas, Das Tripas Sentimento (2018) tem a atualidade desses atravessamentos artísticos e estéticos da cena contemporânea. Ora há escolhas mais da ordem da diversão, acrescidas de humor e outras alegorias dramatúrgicas e coreográficas mais palatáveis, noutros momentos o trabalho se adensa, tal qual a voz de Elis, como a emoção de ouvi-la que sempre acomete os corpos dispostos a essa experiência. Aí o olho escolhe um foco da cena e se aquieta, se inquieta.
Romaria, Cartomante, Gracias a La Vida, Dois pra lá Dois pra Cá, Deus Lhe Pague, Travessia, Alô Alô Marciano, Como Nossos Pais, Velha Roupa Colorida, dentre outras músicas, estão ali reafirmando uma voz, mas dando coro a outras vozes artísticas. Num Brasil de querelas, amarras e mordaças, é cada vez mais necessário ter uma arte posicionada, comprometida com a produção de pensamentos – no caso desta montagem, há um esforço ainda mais corajoso de estar em cartaz sem maiores patrocínios ou recursos de editais. Assim, na cachaça e no sorriso, nas tripas e nos sentimentos, Elis ressurge cênica e coreograficamente como homenagem, arrebatamento e reinvenção. E é preciso ter força, ter garra, sempre.
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DAS TRIPAS SENTIMENTO (2018)
Direção artística e coreográfica: June Machado
Elenco: Cassandra Calabouço, Dani Boff, Denis Gosch, Diego Mac, Lu Paludo, Rossana Scorza e Thais Petzhold
Dramaturgia e Iluminação: Gui Malgarizi
Direção de pesquisa: Eunice Muniz da Silva
Direção de Produção: Sandra Santos
Produção e Cenário: Arthur Bonfanti
Coordenação das Garrafas: Giulia Baptista Vieira
Assessoria de imprensa: Bruna Paulin – Assessoria de Flor em Flor
Visagismo: Equipe Studio Leo Zamper - Leo Zamper, Becca Martins, Gui Kaufmann e Lucas Lemes
Fotografias: Gui Malgarizi e Claudio Etges
Gestão do projeto: Diego Mac
Realização: Macarenando Dance Concept e Casa Cultural Tony Petzhold
Duração: 90 minutos
Classificação etária: livre