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A ÉTICA DA SUBJETIVIDADE
Chat sobre fundamentos do jornalismo e da crítica teatral realizado no dia 9 de junho de 2015, após os jovens críticos Camille Chanel, Marie Gutbub, Judith Engel e Maxi Zahn terem produzido, sob coordenação de Jürgen Berger, quatro edições de um jornal diário durante o Festival PREMIÈRES, no Staatstheater Karlsruhe, na cidade alemã de Karlsruhe.
Jürgen Berger: Gostaria de fazer uma pergunta. Quais os pressupostos necessários para a gente poder falar de um jornalismo profissional e de uma crítica teatral profissional?
Marie Gutbub: Ética! Acho que isso se aplica para o jornalismo em geral. Proteção da personalidade, direito de resguardar o sigilo da fonte, evitar conflitos de interesses, zelo, métodos de investigação adequados. Na crítica teatral, as questões de sigilo da fonte e da proteção da personalidade aparecem menos, mas o resto é extremamente importante. Depois há também os aspectos do ofício: ter-se aprofundado no assunto, saber como obter informações, saber escrever, falar, filmar. E, no caso da crítica, a pessoa deve ainda saber expressar uma opinião, mas não uma opinião do tipo "like/don't like", e sim uma opinião fundamentada, que seja baseada em conhecimento, experiência e pesquisa.
Judith Engel: Um exemplo de profissionalismo, para mim, é quando a pessoa consegue encarar cada montagem com respeito, mesmo já tendo visto outras 15 produções idiotas do mesmo diretor. Ao mesmo tempo, espero que a crítica dê ao leitor a possibilidade de embarcar junto, oferecendo imagens que lhe permitam acompanhar a análise mesmo sem ter estado lá. Sempre acho que reproduzir o conteúdo é uma solução de emergência para quando o/a jornalista não tem o que dizer. Além disso, acho complicada a ideia de que a crítica teatral deveria forjar um diálogo completamente acabado. Entendo que é muito mais interessante quando o leitor reflete sobre o que foi escrito do que quando ele considera a questão como resolvida e pensa consigo: “muito obrigado, agora eu sei o que queria dizer a peça e por que ela foi encenada assim”.
Maxi Zahn: Para mim, um critério é o conhecimento e uma visão abrangente, que vai além daquilo que eu, como leitor, sei.
Chanel: Clarividência. A capacidade de pensar sobre um assunto de maneira inteligente. Manter um distanciamento. Enfim, o jornalista quer trazer informações, mas ele também precisa ter uma opinião...
Engel: Isso do distanciamento é um critério interessante. Não tenho certeza se alguma vez já existiu esse ponto de vista objetivo do crítico. Acho que é interessante, por meio da pesquisa e de conhecimentos básicos sólidos, aproximar-se de um ponto de vista mais objetivo, mas por outro lado acho importante não esquecer de que a crítica é de fato subjetiva. Mas a gente também pode fundamentar uma opinião subjetiva argumentando bem, de modo que ela não seja somente mais uma opinião pessoal.
Berger: Distanciamento. Mas o que quer dizer distanciamento? E como é que nós, como profissionais do jornalismo, lidamos com o fato de às vezes sentirmos mais proximidade de alguma pessoa que é objeto de nosso interesse jornalístico ou de nos identificarmos mais com uma realização estética de uma peça, de um tema?
Gutbub: A partir do conceito de distanciamento estamos apenas a um pequeno passo da objetividade. Objetividade jornalística é uma ilusão, uma mentira. Os seres humanos nunca são absolutamente objetivos, e os jornalistas também não. Mas nós podemos, sim, tratar de lembrar de que não escrevemos para nós mesmos, e sim de que tentamos escrever algo que transmita alguma coisa a muitos leitores. O que eu estou querendo dizer com isso é que tenho que ter consciência como jornalista de que aquilo que nesse momento estou achando muito mais interessante do que todo o resto talvez seja tão interessante para mim porque esse seja um tema que me toca especialmente no momento. Isso não significa que a peça, no caso da crítica teatral, seja melhor, mas sim que a temática me interessa. Isso é algo que eu tenho então que tentar relativizar na minha crítica. Só porque um assunto me interessa, a peça não precisa necessariamente ser boa. A mesma coisa se for do meu diretor favorito, ou tiver uma estética com a qual me identifico. Repetindo: objetividade não funciona. Mesmo assim nós temos que pensar racionalmente, quando não gostamos de algo, se isso é um sinal de que a coisa não é bem feita ou se significa apenas que ela não tem um apelo para nós. É uma questão de achar o ponto de equilíbrio entre uma abordagem emocional e uma análise fundamentada.
Chanel: Os gostos são muito diferentes e o que o crítico diz é válido em primeiro lugar para ele. Pode ser válido também para os leitores, mas não obrigatoriamente. Quando falei em distanciamento, e aqui quero me restringir somente à critica teatral, afirmei que devemos deixar nossos corações e sentimentos de lado. Eu não posso destruir uma peça só porque estou em um mau dia. Nossa vida diária pode nos afetar, mas nós temos que analisar a peça e, então, imergir mais profundamente.
Engel: Estranhamente, eu sempre consigo escrever melhor sobre uma peça quando perco o distanciamento, porque distanciamento para mim significa sempre também que eu levanto um muro bem ali onde o diretor talvez esteja tentando desmanchar um muro. Eu decididamente não consigo manter o distanciamento e não me deixar levar emocionalmente por alguma coisa. Mas acho justamente que escrevo críticas a partir das emoções. Por que alguma coisa me causou tristeza ou me deixou furiosa? Por que acho algo engraçado, por que outras pessoas riem em outros momento: O que esses padrões emocionais dizem sobre a sociedade que está lá sentada na plateia? Eu tenho achado ultimamente cada vez mais importante ressaltar que o que é escrito e publicado é um ponto de vista subjetivo, que não tem nenhuma pretensão de ser universalmente válido. Especialmente no caso de novos formatos teatrais, sejam participativos ou como instalações, penso muitas vezes que talvez seja mais interessante um diálogo entre diferentes perspectivas críticas.
Zahn: Sobre um amigo ou uma amiga eu realmente não conseguiria escrever. Eu os apoio em tudo o que eles fazem, então não acredito que continue tendo critérios objetivos de avaliação. Mas, por outro lado, acho que um contato próximo é importante. Especialmente no caso do teatro. O mundo é tão pequeno, a gente conhece as pessoas sobre as quais escreve muito rápido, e eu acredito que isso seja um bom estímulo. Supondo que eu escreva uma crítica arrasadora, como posso embasá-la de tal maneira que depois disso ainda seja possível falar um com o outro? Teatro e crítica são interdependentes, compartilham um interesse mútuo e recíproco, trabalhando essencialmente sobre o mesmo objeto. Quando se trata de temas, concordo com Camille, se é que a entendi corretamente. Uma crítica deve, sim, tentar ser o mais objetiva possível, mas o/a crítico/a também pode, no texto, deixar transparente sua argumentação.
Engel: Se eu critico alguma coisa com muita contundência, isso para mim deve sempre ocorrer a partir de uma atitude respeitosa. Simplesmente arrasar alguma coisa é algo que eu considero tão sem graça como colocar algo nas alturas sem justificar por quê. A crítica construtiva pode ajudar imensamente, e se a pessoa tem bons motivos para dizer por que achou algo realmente péssimo, e não critica simplesmente por uma aversão estética pessoal, isso pode ser tão válido como quando se escreve uma crítica muito positiva sobre uma peça. Mas sempre a partir da consciência de que críticos/as não têm a palavra final sobre algo ser bom ou não. Os critérios de bom e ruim são afinal uma maldição.
Gutbub: Escrever sobre um amigo ou uma amiga é na verdade um tabu do ponto de vista ético. Evitar conflitos de interesses deve ser um pilar da ética jornalística. No caso de amigos também há interesses envolvidos, não de ordem material, mas de ordem pessoal. Eu não quero ferir meus amigos, não quero brigar, não quero perder meus amigos.
Zahn: Judith, essa coisa das perspectivas dos críticos é interessante. Há pouco, no Festival Premières, todos nós tínhamos opiniões frequentemente muito diferentes. Mas cada um de nós podia justificar por quê.
Berger: A questão do "amigo" significa que a pessoa deveria ser sincera consigo mesma e analisar se a proximidade com amigo é tão grande que ela não escreve mais o que na verdade escreveria? Ou significa que se coloque um limite e se diga: ele/a é amigo, então por princípio não vou escrever?
Gutbub: Isso é uma coisa que cada um tem que decidir para si. Entendo que no mundo do teatro essa decisão é difícil; vocês certamente se conhecem todos depois de um tempo. E me lembro de ter aprendido na Escola de Jornalismo que não se deve aceitar convites para um café quando está se escrevendo sobre alguém. Uma ética desse tipo é importante para mim. Já recusei artigos por se tratar de amigos. A única pergunta é: a partir de que ponto a pessoa diz que tem uma grande relação de amizade? Qual é o limite? Essa é provavelmente uma das decisões difíceis. Sei que nesse ponto sou mais rigorosa do que muitos outros; eu também já defini uma zona tabu, mas existe um tipo de zona intermediária.
Engel: A pessoa pode se perguntar qual é a graça, então, quando ela não se atreve mais a escrever aquilo que pensa mesmo. Mas eu também não escreveria sobre amigos porque não imagino que conseguiria manter o distanciamento necessário. Acho todos meus amigos fantásticos e normalmente admiro também o que eles fazem, mesmo que não tenha nada a ver comigo. Tenho uma amiga que faz arte minimalista, uma coisa que por muito tempo eu achava chatíssima. Então realizei uma entrevista de três horas com ela e depois comecei a ver muitas coisas de maneira diferente. Se tivesse visitado uma de suas exposições sem conhecê-la, a situação seria outra e eu provavelmente não teria tido nenhum interesse em fazer com ela uma entrevista tão longa.
Chanel: A sinceridade não é uma coisa boa na amizade? Comentários críticos, se justificados, podem ajudar a pessoa a evoluir.
Gutbub: Isso é idealista. Você está se esquecendo também da diferença entre sinceridade pública e sinceridade privada. Se eu acho que você não faz bem uma coisa e sou sua amiga, então falo com você em particular. Não vou escrever num lugar onde centenas, milhares de pessoas podem ler.
Chanel: No Premières nós escrevemos sobre novos diretores/as; eles precisam realmente de críticas simpáticas. Isso não quer dizer que se deva somente escrever coisas positivas, mas significa que não faz sentido destruí-los.
Gutbub: O que os diretores/as precisam não me importa. Eu escrevo como jornalista para os meus leitores.
Engel: Eu acho que Marie tem razão. E, na verdade, também é perverso ser mais simpático em relação a diretores jovens, pois afinal de contas isso significa que ainda não os levamos tão a sério quanto a diretores "mais velhos". Se possível, nós deveríamos escrever sobre Castorf da mesma forma do que sobre um(a) diretora(a) do Premières. E vice-versa.
Gutbub: Eu já abdiquei de artigos porque achei o livro que deveria resenhar ruim demais. O escritor não era famoso, assim não valia a pena criticá-lo com vigor. No caso do Premières, eu tinha que escrever, e então, sorry, diretores novos, eu sou sincera.
Berger: Vamos falar sobre as entrevistas. Aos poucos está se estabelecendo o costume de que as pessoas só se dispõem a dar entrevistas por email. O que vocês acham disso? Vocês seriam radicais ao ponto de dizer que uma entrevista só é uma entrevista se for realizada como "embate" ao vivo, seja ao telefone ou ao redor de uma mesa?
Gutbub: Eu odeio entrevistas, seja como jornalista ou como leitora. Tem algumas exceções, entrevistadores brilhantes, que tiram do interlocutor algo que ninguém mais consegue, mas nesse caso o melhor é uma entrevista televisiva, pois então eu quero a voz e a linguagem corporal, o pacote completo. Entrevista impressa eu acho sem graça, é quase que um marketing, pois o entrevistado responde o que quer, e a coisa é geralmente preparada. Em vídeos, mesmo quando as palavras são preparadas, pelo menos a gente percebe a expressão corporal do entrevistado, se ele se sente à vontade ou desconfortável com a pergunta, etc. Por isso a questão sobre a entrevista via email não se coloca realmente para mim, porque também não considero grande coisa as entrevistas faladas ao redor de uma mesa. Mas se uma entrevista é necessária, então faria isso da melhor forma possível, isto é, ao redor de uma mesa, na vida real. Mas somente caso seja absolutamente necessário. A única forma de entrevista de que eu gosto é a entrevista para pesquisa. Isto é: fazer perguntas para obter material de base, mas não necessariamente citar. Isso pode ser feito, dependendo do assunto e da profundidade, por email, telefone ou ao redor de uma mesa. Se o assunto for a pessoa, então junto à mesa, mas se o importante forem três números de que preciso como cientista, então um email é suficiente. Entretanto, não publicaria uma entrevista por email como entrevista num jornal, exceto em casos excepcionais como, por exemplo, se alguém se encontra na prisão e não pode falar pessoalmente com jornalistas.
Engel: Tenho um grande respeito pela arte de fazer entrevistas e infelizmente preciso dar razão a Maria e confessar que as entrevistas são geralmente a última coisa que eu leio numa revista ou num blog. Por muito tempo eu não achava a ideia de entrevistas por email ruim, porque eu pensava que na forma de escrever se refletiria uma linguagem pessoal e que para a maioria das pessoas não faz mal nenhum se elas têm tempo para refletir sobre suas respostas. Eu partia do princípio idealista de que para o entrevistado a sinceridade era mais importante do que a figura que ele faria na entrevista. Se entrevista por email significa que eu tenho tempo suficiente para pensar em como embalar uma coisa sobre a qual eu não teria conseguido dar uma resposta resoluta espontaneamente, com a ideia de marketing isso fica mais complicado. E acho ainda mais sem graça entrevistas com pessoas que já foram muitas vezes entrevistadas, a não ser que se façam perguntas realmente boas. Isso porque frequentemente temos a sensação de que as perguntas são aproveitadas de maneira muito inteligente como ganchos para algo que o entrevistado quer trazer a público no momento. Entrevistas transformam-se muito rapidamente em sessões de publicidade para o entrevistado, se ele assim o quiser. Então no máximo ainda são interessantes aquelas pessoas que não se levam tão a sério.
Zahn: Eu amo entrevistas. Cada conversa tem sua própria atmosfera, e isso é algo que eu quero ver também no texto. Se sou eu o entrevistador, gosto de insistir numa questão, de esmiuçar os detalhes. Na entrevista por e-mail, não é possível fazer isso. Então, não. Entrevistas por email não funcionam. São meramente informativas e se transformam em algo sem graça e que coloca o entrevistado em uma posição segura demais, que lhe permite fazer seu marketing pessoal. No formato ao vivo, no caso de um bom entrevistador, é possível atravessar a máscara de marketing.
Chanel: Talvez a questão seja porque os entrevistados hoje em dia prefiram dar entrevistas por e-mail, mesmo estando preparados para responder a determinadas perguntas. Falta espontaneidade na troca de emails, e espontaneidade, na minha opinião, é o que interessa numa entrevista, numa conversa em geral.
Berger: É verdade que, na maior parte das vezes, um artigo baseado em pesquisa e contextualizado tem mais valor e é mais produtivo do que uma entrevista, que só foi realizada porque isso pode ser feito rapidamente. Mesmo assim, eu não rejeitaria entrevistas por completo. Tenho a impressão de que o mais importante é avaliar bem quando uma entrevista realmente faz sentido. E devemos nos preparar também no sentido de nos perguntarmos: como me porto com entrevistador? Fico completamente confuso se alguém sabe me envolver com seu charme?
Gutbub: Dá para se fazer, mas eu quase acredito que entrevistar é uma profissão em si, que tem muito pouco a ver com o jornalista que escreve. E então, repetindo, o melhor é uma entrevista em vídeo. A linguagem corporal é muito importante, a voz também. Então, eu diria: entrevista em vídeo com um entrevistador profissional.
Engel: Sou extremamente suscetível ao charme das pessoas. Por isso não gosto de fazer entrevistas. Não me sinto bem no meu papel, mas é uma coisa que se pode aprender.
Gutbub: Judith: +1, same here. Mas na hora de transcrever e editar o texto, o charme não me importa mais. Só durante as perguntas sou simpática demais. Por isso sou a favor de um profissional especializado em entrevistas.
Engel: Isso é o que torna a coisa desagradável, a gente é confrontado com o próprio não-profissionalismo, sucumbindo ao carisma de uma outra pessoa. Desagradável.
Berger: Minha impressão: com o tópico "entrevista" a gente penetra num campo muito abrangente, porque, excluindo as entrevistas via email, trata-se de uma forma da comunicação direta com todas as possibilidades e armadilhas próprias dessas situações. Nós poderíamos aprofundar isso, mas prefiro, sobretudo porque Marie insiste tanto na entrevista em vídeo, conversar com vocês sobre as mudanças no jornalismo em função da internet e que tipo de jornalismo na internet faz sentido. A crítica teatral mudou na internet? Caso sim, como?
Gutbub: Já está na hora de os jornalistas se acostumarem com a ideia de que a internet transformou a sua profissão. Sorry, pessoal, mas a internet traz muitas vantagens e o mídia impressa não vai continuar a ser o que era. Para mim se coloca a seguinte questão: como nós, jornalistas, vamos aprender a produzir um jornalismo bom e fecundo na rede? Como lidamos com fato de que muito mais pessoas podem publicar na rede e de tentar fazer com que nossa voz, nosso veículo seja ouvido? Como posso usar todas as possibilidades que a internet me oferece de forma sensata como jornalista? Existem, é claro, os princípios básicos, como a produção multimídia, uma coisa que está sendo megavalorizada, que está se desenvolvendo aos poucos como num laboratório. Um dos exemplos mais conhecidos é provavelmente o projeto Snowfall, do New York Times. E então vem a pergunta: quem é escutado na internet? Nisso ainda tem que se trabalhar muito. Com a Web 2.0 a publicação ficou muito mais fácil, a ponto de qualquer um poder decidir tornar-se jornalista. Então, depois de algumas experiências na área do "citizen journalism", nós entendemos que o jornalismo é uma profissão que precisa ser aprendida. O netizen ganhou voz e não abdicará mais dela. A solução é provavelmente o jornalismo participativo: o jornalista reconhece que o leitor pode dar sua contribuição, e o leitor reconhece que o jornalismo é uma profissão, um ofício, e assim se cria uma cooperação. Na questão do financiamento foi cometido um grande erro desde o início: oferecer notícias gratuitas na rede. Isso não vai mais retroceder. Mas notícias de qualidade, bem investigadas, matérias exclusivas, não no sentido de furos de reportagens, mas de artigos de opinião, reportagens de qualidade que não se limitam a copiar & colar "news nuggets" da dpa no SPON, tudo isso pode ser financiado pelos leitores. Acho que a boa crítica teatral também se encaixa aí.
Engel: Não sei se tenho uma resposta para isso. Quando comecei a me ocupar de teatro e de crítica teatral já existia a internet. Não sei agora se eu percebi uma grande mudança. Sou apaixonada pela internet no sentido de que ela é minha fonte de busca número um, mesmo se estou fazendo pesquisa bibliográfica. Como arquivo, a internet é fantástica para uso jornalístico. Ali são colocadas tantas informações novas e de uma tal abrangência sobre todo e qualquer assunto que algo ocorrido há dois dias já me parece como que soterrado pela avalanche de reações a respeito. Isso, para mim, é difícil, porque, como falei antes, penso relativamente devagar ou chego a resultados completamente diferentes quando reflito sobre alguma coisa. Mas se uma crítica teatral, por exemplo, só tiver valor ou só for considerada informativa na internet se puder ser consumida o mais rapidamente e o mais facilmente possível, isso é um problema para mim. Não funciono assim e também nem quero funcionar assim. Eu acho interessante também a função do comentário, mesmo quando não é muito entusiasmante o que esse fórum democrático de ideias traz à luz.
Zahn: Eu também tenho um pouco de dificuldade de descrever as mudanças. Da minha perspectiva, diria que pouco leio blogs porque ali me falta um pouco o selo de qualidade que tenho de alguma forma quando leio um jornal ou uma revista.
Chanel: A Internet é mais prática do que uma montanha de papéis, mesmo que o que se encontra impresso seja às vezes mais interessante. Mas a internet de fato nelhora a cada dia. Para que comprar um jornal se está tudo grátis na internet? Esse é um problema para a economia da mídia impressa. Mas isso não é novidade alguma.
Berger: Nós falamos sobre a ética da subjetividade. Temos que pensar de maneira mais incisiva sobre essa ética em relação aos novos fóruns online? Ou melhor: como julgar o fato de que, mesmo em fóruns online que têm por trás uma redação, já pela velocidade com que tudo acontece, uma maior quantidade de estupidez consegue encontrar espaço, sendo que nas redações a ideologia dominante é a de que a internet é a liberdade por natureza e se parte do princípio de que a publicação de um texto seja um ato de liberdade, mesmo quando é uma bobagem?
Engel: Bem, isso é provavelmente algo que ainda está em fase de transformação. Enfim, a internet está sujeita a outros mecanismos como, por exemplo, com que rapidez e onde algo se propaga. Mas se de repente um conteúdo estúpido ganha uma plataforma, e não somente como opinião pessoal mas devido a muitos "likes" ou outros métodos de propagação, então isso diz algo sobre que formas e conteúdos recebem mais atenção. E aí se chega à figura do leitor. A internet não tem o que fazer diante do fato de que a qualidade deveria ser reconhecida e exigida também pelo leitor para que as coisas funcionem de maneira diferente. A internet como veículo não é decisiva para a qualidade de alguma coisa. O jornal Bild também tem vendas altíssimas.
Zahn: Eu não tenho certeza. Acho que esse não é necessariamente um problema da internet em geral, mas especialmente das redações. Lamento que na área de crítica teatral não exista simplesmente nada além do (portal) Nachtkritik. As revistas maiores simplesmente dormiram nesse ponto, e os jornais em geral fizeram ainda pior. Eu não vejo nas revistas qualquer resposta à pergunta sobre como lidar com as mudanças. Como lidar com a concorrência na rede?
Gutbub: Jürgen, aí você está tocando na questão do “citizen journalism”, que eu citei antes. A curta história da internet mostrou, entretanto, que esses sites acabam sucumbindo depois de algum tempo se eles não são bons o suficiente. Para eles sucumbirem, porém, é preciso que seja oferecida uma alternativa. Se existir um bom site de teatro, com bastante conteúdo, com conteúdo de qualidade, então os leitores vão abandonar os fóruns ruins. Com a internet, os jornalistas ganharam a responsabilidade de reinventar o jornalismo. Todo cidadão pode escrever; mas a gente só precisa ler o que considera bom. Então, se os jornalistas são melhores, eles deveriam mostrar isso na rede. E eu estou convencido de que bons jornalistas são mil vezes melhores do que muitos bloggers e jornalistas da mídia cidadã. Mesmo assim, atenção: um blogger NÃO PRECISA ser ruim, também existem algumas pérolas. Pensem por exemplo em Glenn Greenwald, ele também era blogueiro e não estudou Jornalismo. Os jornalistas só precisam aprender a não ter medo da internet e compreender que na rede não se trabalha como nos veículos impressos.
Berger: A gente pode fazer uma distinção entre os fóruns online, que oferecem "jornalismo cidadão" e para os quais o marco regulatório do jornalismo não é válido, e outros sites na internet que se consideram como um formato jornalístico profissional. E, se é assim, então também não vale para os sites que se compreendem como tendo o formato jornalístico que a respectiva redação esteja sujeita aos mesmos critérios de qualidade válidos para os veículos impressos?
Zahn: Sim, eu acho que os critérios de qualidade devem ser os mesmos. Mas a gente deveria ver como a internet expande esses critérios e não simplesmente fazer “print” na rede. E, sim, é possível fazer uma distinção entre jornalismo cidadão e formatos profissionais.
Engel: Eu me pergunto como fazer esta distinção.
Gutbub: Sim, a gente pode fazer a distinção. E lamento por isso, porque o jornalismo cidadão é um ideal bonito e eu gostaria que funcionasse. Mas o jornalismo é uma profissão, um ofício. Eu falei com Pierre Haski a respeito, um jornalista francês que criou um site de jornalismo participativo. Ele havia constatado que o jornalismo cidadão em si não funciona pelo fato de o jornalismo ser um ofício. Mas a ideia da internet é que todo mundo possa publicar. Por isso surgiu a ideia de jornalismo participativo. Jornalistas que escrevem eles mesmos e fazem a curadoria e redação de artigos que supervisionam. Porque, como ele disse, “o cidadão pode até ter visto que ocorreu um acidente que o jornalista não viu, mas ele não telefonará à polícia para perguntar sobre o resultado da investigação da causa do acidente, porque ele não aprendeu a investigar”.
Engel: Talvez isso seja arrogante, mas eu inclusive não considero tudo o que é impresso como jornalismo de qualidade.
Berger: Obviamente. Mas isso significa que uma vez que na mídia impressa não existe apenas jornalismo qualitativo, então nós vamos achar muito legal quando cresce a falta de qualidade na internet?
Engel: Não, mas a gente deve ter uma resposta a toda essa coisa sem profissionalismo que nos tira do sério;. Temos de fazer como Marie diz, que é parar de ter medo e se confrontar com isso. Por exemplo, eu acho que o próprio layout de alguns sites de revistas na internet é tão confuso que eu não tenho vontade de ler. A Kultiversum, por exemplo, tem um layout tão horrível que chega a doer. O mesmo se aplica ao Nachtkritik. Dá para ver por aí que foi relativamente pouco discutido como é o comportamento de leitura na internet. O layout é totalmente confuso e parece que simplesmente se transportou para a tela o formato do jornal. E não deveria ser assim. Há outros formatos para o jornalismo e também para as críticas teatrais que são mais lúdicos e com os quais se poderia trabalhar. Além disso, a internet é um veículo de imagem, e então surge a questão de quanto ainda preciso descrever quando é possível assistir a três minutos de um bom trailer? Isso leva a muitas questões e à reflexão sobre como a crítica teatral poderia ser diferente, como poderia ser repensada. Então estaríamos um passo à frente do mau jornalismo, que nos incomoda, ou teríamos pelo menos uma contraoferta.
Gutbub: Não é legal quando o mau jornalismo cresce. Mas não é tão ruim também. Sempre existiram e sempre existirão pessoas que se contentam com maus jornalismo e teatro, ou maus livros e música ou com o Mc Donalds. Um lugar para o bom jornalismo sempre existiu e continua existindo paralelamente. O problema é que este lugar não está ocupado integralmente por nós jornalistas. Eu acho que, no momento, existe mais lugar para jornalismo de qualidade, bem feito, independente e bem investigado do que oferta de jornalismo de qualidade, bem feito, independente e bem investigado.
Zahn: Gente, sinto muito, mas eu tenho que sair. Eu preciso ir fazer a minha prova de croata. Vocês podem me enviar as perguntas restantes por email.
Berger: O que vocês acham? Sem Maxi esse chat vai ficar desfalcado de 1/5 de cérebro, e confesso que também já estou meio cansado. Para mim seria importante que nós voltássemos a discutir sobre a questão do "Jornalismo profissional na internet", especificamente sobre que critérios devem ser válidos. Vamos marcar outro chat?
Gutbub: Estou extremamente cansada, ainda nem almocei. Vamos simplesmente fazer mais para o final da semana ou na semana que vem a Parte II? Senão nós já temos aqui bastante material. Sugiro deixar agora um pouco de molho e numa outra hora fazer mais um chat.
Zahn: Bem, me avisem o que vocês decidirem! Um abraço. Tchau, tchau!
Chanel: Para mim qualquer coisa está bem, mas durante o dia é melhor.
Engel: Eu também sou a favor de dar uma parada e depois de uma continuação com todos recuperados.
**insira todas as tags, separadas por vírgula (,)